Num
bonde de Botafogo, Rio de Janeiro, conversam uma jovem senhora, mãe de uma
menininha que a acompanha, e sua amiga. As duas vão falando animadamente
sobre assuntos diversos, e no meio delas, a criança se sente um tanto
desnorteada.
Volta
a cabeça de um lado para outro, ao mesmo tempo que sublinha cada frase com uma
expressão de inteligência ou incompreensão. Quando o assunto está em plena
efervescência, a criança intervém com um aparte. E daí em diante a
conversa, passando de um lado para o outro, inevitavelmente pára, a uma objeção
da pequena interlocutora.
A
certa altura da conversa, a mamãe começa a ficar um tanto inquieta em relação
às observações da menina. Mais adiante, já aponta para a paisagem, a ver
se ela se distrai. Mas a menina está muito interessada no assunto, e a amiga da
mãe parece estar muito satisfeita com isso. O bonde anda mais um pouco,
enquanto a criança faz seu comentário pertinente.
Então, a mamãe sorri para a amiga, como quem diz: “Você sabe, é preciso calar a boca desta tagarela...”: e pondo a mão em concha no ouvido da menina, diz qualquer coisa para a amiga, acompanhada de um olhar muito confidencial.
Então, a mamãe sorri para a amiga, como quem diz: “Você sabe, é preciso calar a boca desta tagarela...”: e pondo a mão em concha no ouvido da menina, diz qualquer coisa para a amiga, acompanhada de um olhar muito confidencial.
-Como
é? - a menina não entendeu bem.
E
torna a mãe a repetir o segredinho, enquanto a mão enluvada diz que não, com o
indicador autoritário e irritado. Como conclusão do armistício, um
beijinho rápido e inesperado nos caracoizinhos dourados enrolados na
testa.
A amiga sorri, a mamãe sorri, e a menina olha para uma e para outra, meio desconfiada e desapontada, sem dizer mais nada.
A amiga sorri, a mamãe sorri, e a menina olha para uma e para outra, meio desconfiada e desapontada, sem dizer mais nada.
A
criança pode ter uns cinco anos. Quando tiver mais dez a mamãe um dia lhe
perguntará, entristecida: “Mas, minha filha, que segredo é esse que você me
esconde? “
Já
não se lembrará que ela mesma lhe ensinou a calar... Que dividiu a vida em duas
partes: uma que se pode, outra que não se pode mostrar. E a menina, que
antigamente assistia aos exemplos de casa, está praticando, agora, aqueles
exemplos.
Quem
nos traz tais preocupações com a educação infantil é a ilustre poetisa
brasileira, Cecília Meireles, em uma de suas muitas crônicas sobre
educação. A autora é muito feliz em apontar um costume muito comum nas
famílias, e que gera conseqüências desastrosas, em muitas ocasiões.
Por
vezes, sem perceber, pais e educadores ensinam os filhos a calar, a esconder
sentimentos e a mentir. Seus exemplos ensinam sempre mais do que qualquer
retórica inflamada. As crianças fitam a conduta dos pais, e se inspiram
nela, já que são sempre seu primeiro e maior referencial.
Precisamos
redobrar o cuidado, e manter com os filhos, desde tenra idade, uma relação
franca, sem segredos e sem mistérios. Explicar sempre a razão dos não e
dos sim, que serão freqüentes e naturais, faz-se condição indispensável para
construir uma boa relação de respeito e amizade. O caminho do porque sim e
pronto, ou do porque não e chega, é mais cômodo para os educadores, porém, é
perda de oportunidade de educar com profundidade.
Cultivar
o diálogo aberto e franco sempre, é cultivar o amor em sua expressão mais bela
e luminosa.
Imagem:Google
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